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Tag: romance
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Não gosto que me chamem assim
Eles perderam a graça de vigiar-me. E me olhavam feio. Mas quem ia perdendo as graças de qualquer maneira era eu, sem dúvida. Fim das férias. Os primeiros dias de serviço foram menos repugnantes, mais suportáveis do que eu previra. A começar pela nissei que atravessava minha manhã, sempre vinda da estação do metrô, sempre…
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Um relógio, por exemplo
O tempo é a oxidação da realidade, o sol causticante ou a umidade nociva que contribui para a lenta dissolução das coisas. Se reencontro um objeto que me serviu na infância, entendo que é o único resquício, tudo que restou do que não há mais. Esse mesmo objeto toma forma em minhas mãos apenas no…
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Por vezes, como uma canção de ninar
Voltaria outra manhã, que nunca é a mesma. O sempre das manhãs que voltam é que é sempre o mesmo. O que está acontecendo? Alguma coisa dá sinais de possuir-me, está presente. Não é apenas uma impressão. Mas não faço ideia do que seja. Quero crer que o cansaço tenha me alterado, quem sabe. O…
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Para se pensar em crocodilos e borboletas
As coisas da realidade mostravam-se sempre espantosas, ainda que alguém as visse todos os dias.Era preciso distrair-se delas, o que equivalia a vê-las todos os dias, para então assombrar-se, irresistivelmente. Água explodindo em sua cabeça, em seus ombros, o primeiro jato repentino antes que girasse de volta a torneira até adequar-se, e ao fluxo, a…
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Por quem o luto imprevisto?
Há um tempo para cada sentimento que se manifesta e que se dissipa. É preciso que seja assim. Trata-se da saúde emocional da humanidade. Vamos lá, você também deve ter tido uma experiência semelhante. E não? Tente recordar, registre-a. Era uma vez um gato xadrez… – começava assim uma velha cantiga, lembra? Você só quer…
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A primeira história mágica interrompida
Em outra fase conheci o fim da história. Antes não o soubesse: a duração desse enigma era motivo de eu estar vivo. A primeira vez que me lembra ter ouvido uma história deu-se, magicamente, em uma noite de chuva, e eu não estava em casa. Ao redor da cama, fazíamos um aglomerado de crianças curiosas…
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Homens (não tão) fortes à procura
Mas sim, voltava para incomodá-lo uma lembrança que podia jurar extraviada para sempre… Só depois de ter voltado pela quarta ou quinta vez aos mijadouros é que admitia estar perdendo o controle sobre sua lucidez. Enquanto urinava, tinha ânsias de vomitar, com o fedor morno daquelas latrinas. Paredes encardidas, riscadas à caneta ou a canivete.…
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Onde não havia palavras
Não me lembrava qual rei secular ou general antigo havia atravessado qual fronteira. Mas queria muito saber por que tudo aquilo havia desaparecido para sempre, após tantas desgraças. Nada mais intencional terá melhor resultado em nossos dias, aliás, bem pouco pôde ser feito desde que Machado, nosso feiticeiro-mor, e desde que Augusto, cientista das sombras,…
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Já viu o prédio onde ela mora?
Os endereços são transitórios ou duram toda uma vida, o que muda é estar alguém vivo para habitar sempre um mesmo lugar. Mas Treze, de alguma forma, atraíra-se por ele, vira algo diferente nele, o que nem sempre alguém notava. Pensa enquanto anda, anda enquanto pensa, nunca lhe faltara a resignada consciência de que não…
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Treze não era uma fada qualquer
Dessa vez teve vergonha de perguntar se ele vivera uma noite de sexo com ela. Mas mordia-se o lábio inferior, muito suavemente, com grande curiosidade. Não era bem uma carta, mas um bilhete. Foi bom ter conhecido você… E os momentos que passamos juntos… Por favor, não me procure mais… Aquele endereço que eu te…
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Mal dessas idades…
Eu me defrontava com trechos de outra profundidade. Sentia percorrer-me um arrepio singular, do fundo da existência. Mal dessas idades é estar sempre esperando. De outras também, ou será mal de todas as minhas idades, meu próprio mal transcorrendo ao fundo de todos os dias, caso eu o admita de uma vez, essa ingenuidade de…
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Herói sem rumo
Dentre as antigas aquarelas da memória e outros gestos de nuvens, tais são algumas das imagens que nunca se diluem. Coelho me havia feito recordá-las quando anunciou que os instrumentos se unissem. Eu as revejo sempre que quero retomar a esperança. “Corre, vai chamar todo mundo!”, ordenou-me o menino que comandava nosso time, com isso…
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Versos versus mundo
De um lado, as palavras (que podem mudar o mundo). Do outro lado, o mundo. Que não tem nada a ver com as palavras. Eu alugava um pequeno apartamento que Verena ajudou a transformar. Não só com objetos. Não só o apartamento. Foi ela quem me incentivou a deixar os cabelos compridos e a prendê-los…
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Adeus, Águas Claras
A chuva que caiu à tarde antecipou nossa partida em um dia.Romão dirigia um velho sedã de interior espaçoso. Verena ia ao seu lado. Que não se depreenda de meus escritos um clone de minha pessoa, aparentemente humano, mas sem sangue, sem carne, propenso a desejos metafísicos mais do que a desejos naturalmente mais intensos…
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O gineceu reconquistado
Nem sempre sabemos ao certo o que buscamos. Mas é algo que os covardes fingem ter encontrado para nos manter próximos de seus limites. Noite de lua clara. Romão, Cândido e Clemente iam ao concerto. Eu queria apenas estar sozinho, longe do som infernal que se espalhava pelo descampado, que parecia irradiar-se pelo mundo. Com…
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O centro em parte alguma
Meu inconsciente vê. Meus olhos são cegos. Sou muito pequeno para acreditar em alguma coisa. Não vejo. Não sei. E estou preso às correntes da vida, aos ciclos e ao tempo. “Pablo não apareceu hoje. Dona Norma não lhe perguntou nada?” “Não, senhor. Ela está preocupada?” “Um pouco, sim, senhor Júlio. Mas ele sempre volta.…
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Por que deixar rastros?
A vida é sempre uma transição, mas em alguns casos isso parece mais intenso. Os poetas já nascem derrotados, vencidos por uma realidade que impera contra sua sensibilidade para ninguém. Mais um dia pela frente. Nada para fazer. Cândido e Clemente queriam ver o rio ainda uma vez, antes de partirem no dia seguinte, não sei…
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Fronteiras de fumaça, luzes insuficientes
Os artistas se encontravam, ora irradiando alegrias, ora parecendo querer transmitir a todos um clima de sombria desesperança, como se numa determinada noite estivessem todos de acordo em considerar a vida um conjunto de melancólicas situações. Oásis. O outro bar. Música ao vivo. Cantor, violão, percussionista precariamente equipado: nem mais do que isso seria necessário…
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Mais uns dias, por que não?
Uma intensa sensação de alívio supondo-se que nossa vida tenha se cumprido. Porque nada precisa de nós. Nem as maiores instituições do mundo, nem os grilos mais próximos. Não fui ao concerto nessa noite. Tentei escrever à luz de uma lanterna, mas não pude concretizar um verso sequer. Suspirei desanimado, cansado mesmo, não só desse…
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Não apagou um agora mesmo?
Difícil reconhecer que tanto essas imagens soam exageradas quanto possíveis. Tanto quanto sua imaginação produz imagens sinistras, flui também, involuntariamente, a sequência que leva à aproximação daqueles rostos… Acende outro, não se importa com isso. Mas parece-lhe que o cigarro anterior se esfumou espaço fora sem que o percebesse. É preciso admitir. Não consegue evitar.…
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Truque bem-educado
Eu não queria admitir, mas sua proximidade me incomodava, acelerava-me a pulsação. Por motivos óbvios, digamos. No dia seguinte, ainda com Verena na cabeça, tentei escrever um poema. Até consegui terminá-lo. Mas ficou espichado, redundante, uma chatice. Não dava vontade de ler mais de uma vez, como ocorre com os bons poemas. Eu me propunha…
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Como cães farejadores
As infâncias parecem não envelhecer nunca. Júlio repassa retratos antigos: ali estão seus pais, seus tios e primos de seus pais, todos ainda crianças. Hoje, essas crianças não existem. E aquele mundo que as cercava, que era tudo, magicamente desapareceu. “Ei, moço!”, a mulher de rosto redondo e dentes irregulares, de sua barraca de bijuterias,…
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Treze descuida-se de um segredo
E como parecia desde o início acertado entre eles, com um mínimo de palavras e quase secretamente, seguiam em busca do lugar onde ficassem juntos, isolados dos que nada confessavam em diários íntimos. Dos que não se importavam com o registro. Dos que não precisavam saber… Alcançaram a larga avenida, de tráfego rápido e bem…
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Uau!
Quando ouvi a palavra, o código, as sílabas mágicas que me abriam seu nome, foi como se ela toda florescesse. Quando só há imagens é porque não encontramos ainda as palavras. O chá-mate escurecido, nunca o bastante que mesmo a manhã de nuvens não pudesse tornar claro, produziu um efeito extraordinário sobre meus sentidos. Eu…
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Treze pode continuar
Depois do que Bruno lhe dissera, ou tentara lhe dizer, ele a examinava com redobrada curiosidade, como tendo à sua frente a encarnação de alguma dissimulada feiticeira ou de uma misteriosa criatura mítica, influenciado por uns adereços, colares e pulseiras étnicas. Ruas obscuras, postes de lâmpadas anêmicas… – não terá sido um artifício romântico demais…
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Qualquer coisa morna
Ela tinha os olhos claros, vivos e brilhantes. Parecia inteligente, além do mais. E a beleza, como a inteligência, também assusta. Pela manhã, ergueram uma barraca em frente à nossa. Um grandalhão de barba e cabelos negros, curtos. Um rapaz magro mas musculoso, loiro de cabelos escorridos, corpo rígido, bermuda desfiada. Uma garota clara, robusta…
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Treze, uma abelha assassina?
“O que então? O que eu tenho a perder? Ela é algum tipo de maníaca, alguma abelha melífica, vai me assassinar depois de nos acasalarmos?” Bruno percebeu que ele já declinava a seus exemplos exagerados e obsessivos, próprios das situações em que não pretendia voltar atrás. “Você vai o quê?”, Bruno e seu cigarro pela…
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Os três patetas sem violência
Algumas latinhas nos puseram a pique. Dormimos com os cobertores trocados, nas posições mais incômodas que se pudessem conceber em uma barraca daquelas. Mais dois nomes, vá lá: Cândido e Clemente. Esses dois… Cada um deles, como dizem, uma flor de pessoa. Cândido Rosário Cruz e Clemente da Trindade. Identificavam-se comigo, porque também eu era…
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Ana, Dulce, Treze, Cátia…
Já perdia quase inteiramente a convicção, durante tanto tempo alimentada por seus colegas de estudo, de que era intelectualmente bem-dotado, o que eles confundiam com muito interessado. E suas perspectivas haviam declinado a um estranho silêncio. Ana. Em meio à minha incapacidade para romper o tédio, minha quase imobilidade completa, algo como se a inércia…
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Fraudes por uma boa causa: a minha
Começou então uma espécie de questionário detalhado, ao qual eu ia respondendo com uma enorme fingida inocência. Com aquela cara que só eu sei fazer nessas horas. Saturado. Férias vencidas. Não aguentava mais ouvir falar em processos e tinha saudade das balanças. Caí doente, gripe demolidora, febres avulsas. Telefonei para explicar-me, tive de ouvir mais…
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Um segredo, entre outros
Sempre observara detalhes e minúcias, à maneira de um estrategista. Sempre tivera a impressão de estar sendo enganado. No intervalo de almoço, repassar sem compromisso as estantes de discos das lojas. Procurar um livro com a ajuda sensual de uma vendedora a quem aparentemente também corresponda algum interesse. Encontrar com grande prazer um objeto sob…
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Paradoxo do registro e do esquecimento
Somos todos muito exagerados, não vê? Não temos essa importância toda. É tudo muito rápido. “Você vai escrever sobre nós?” Homens e mulheres, meus colegas de escritório. Todos à minha frente, mais ou menos juntos. Mais ou menos quietos. Mais ou menos tristes. “O quê? Escrever sobre vocês? Por que faria isso?” “Pela eternidade.” “Para…
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Coelho, uísque e gelo, sonatas de piano
A música parecia esgotada. Bach e Mozart foram deuses. Crianças-prodígios, nasceram gênios. Beethoven foi muito maior. Ele era um homem. E tornou-se um deus. Pablo e Cândido os espreitavam, tão logo percebiam o ruído das chaves, o rápido rangido na porta de entrada. Mesmo habituados aos novos moradores, ainda lhes dispensavam uma discreta curiosidade, enquanto…
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Ácaros e outros micro-organismos
Quem o visse quase comovido um minuto atrás não poderia crer que fosse a mesma pessoa. Assim como quem o visse menino, arrastando seu caminhãozinho de madeira. Por bem pouco, o serviço não escapava ao meu controle. Algumas interferências ocasionais e detalhes de meu próprio esquecimento faziam de minha mesa um espaço confuso, de documentos…
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Agenda de não-planos
Talvez estivessem todos procurando voltar.Talvez não avançassem, como fazia supor a realidade. Talvez não viajassem ao futuro nem as agulhas apontassem o norte. Júlio questionava, embora não o agradasse, o que fazia ao lado de um tipo displicente como Bruno, dividindo com ele um determinado endereço. Fora isso, sacrificando cada dia pela continuidade de…
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Camelos, dromedários e o melhor de um mundo pior
Mas não importa a época, nunca podemos escapar a um mundo pior. Nada parece impedir que os governantes exerçam, renovem e aprimorem suas intenções. É preciso que se diga: há escravos e escravos. Não se deve padronizá-los, como a ninguém, afinal eu também fazia parte desse rebanho, registre-se. Há tipos distintos, há asnos descontentes e…
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O número zero e as dez mil coisas
As conquistas humanas primeiro impressionam pelo desafio aos limites. Depois nos cansam como se tudo fosse apenas uma alegoria, uma amostra do que éramos capazes… Não sabe o que pensar? Ora, não é o fim de tudo. Conheci poetas que nos aconselhavam a não pensar, eles próprios passaram a vida pensando, pensando, pensando… Outros houve…
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Episódios de minha desastrosa inclusão social
Mas sempre alguém me chamava de volta ao assunto na mesa que nos servia. Perguntavam o que pensava eu de certas notícias, eu ia mentindo como podia, claro, para contentá-los a todos. Já disse que o teto era baixo e opressivo. O sanitário masculino não dispunha de vitrô ou de qualquer saída de ar, por isso…
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O meio-dia cinzento
Sentia-se outro, a partir do nada. Fazia daquela chuva uma referência gratuita para ser agora e à frente, para tornar a viver, prosseguir sem qualquer passado. O meio-dia cinzento do intervalo de almoço trouxe a chuva de surpresa que os forçou, a Júlio e aos outros, aos cidadãos desse dia, ao refúgio sob toldos e…
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Se é que eu suportava alguém…
Nessa época, eu imaginava (quase sem querer, juro) algumas de minhas colegas passeando pelo escritório seminuas. Bem, bem. Coisas de primatas. Eu comecei motivado, entusiasmado, por que não? Atendia clientes ao balcão, dedicando-lhes o máximo de atenção e simpatia, conforme eu mesmo me aguentava. A assistente do doutor Aguiar, aquela que eu disse que poderia…
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A grande notícia trágica
Enquanto isso, uma conclusão se desdobrava em outra, entre tantos como ele ao redor e à luz dos olhos de cada um. E sempre essa viagem se repetia. E sempre havia gente nos vagões. DIRIJA-SE À PLATAFORMA OU ACESSO MAIS CONVENIENTE ORIENTANDO-SE PELAS PLACAS DE SINALIZAÇÃO. No metrô, também se comentava a notícia mais chocante…
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O escravo se diverte
Não posso negar que alguma vez também palpitou em mim um tesão de esperança pela mascote do escritório. Mas ela era tão magrinha, enjoadinha, irritadinha… Beethoven acreditava que os seres humanos eram todos iguais. Beethoven! Para estragar tudo, basta citar o senhor Antão de Almeida, que, mesmo tendo sido um crápula mesquinho e oportunista durante…
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Algo entre dois silêncios
Desde o começo, eu vinha tentando evitar que isto parecesse triste ou trágico, não sei. Tenho lido pouco, pouca coisa ou quase nada tem despertado minha atenção. Nessa mesma noite, ouviram um grito. Algum edifício próximo, quem sabe. Júlio acordou primeiro, foi à janela. Bruno praguejou, protegendo-se com o travesseiro, logo voltou a dormir. Um…
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Esses homens…
O doutor Aguiar, notadamente um homem de talento. Podia passar da austeridade ao afeto, com pessoas diferentes, claro, como se acendesse uma lâmpada. Primeiro dia. O doutor Aguiar recebeu-me com tal disposição e tanta cordialidade que eu quase me convenci de seu caráter humanitário. Mas logo pude ver-lhe o fundo da alma, ao observar sua…
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Bruno, o fantasma, e a medusa e…
Toda juventude, todo desejo e sua respectiva consumação, todo encontro e encantamento, toda intimidade, experiência e êxtase estejam submetidos às mesmas leis de ausência que atravessam toda atualidade. Parece incrível. E é verdade. Bruno não tinha vinte anos quando deixou sua cidade. Uma de suas últimas aventuras quase acabou por envolvê-lo em sérios apuros, porque…
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Eu era um adulto agora
Não estava apenas vivendo e passando pelos dias, como todos os que trabalhavam comigo. Eu não era um medíocre qualquer, era um medíocre especial: eu tinha um plano. Eu era muito jovem, não foi o que eu disse? E apertava a mão de todo mundo. Meus cabelos eram aparados à americana, e todos podiam ver…
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Adeus, Júlio Dias
O tempo, em minha crença precária, era vinculado às distâncias e não tinha estas garras a arranhar-me os olhos. Estas unhas nervosas sobre o meu rosto. Choveu o dia todo em que eu parti. Como a servir de fronteira entre duas fases de minha vida, a chuva fina insistiu em molhar todas as estradas, sem…
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Das balanças à justiça: o cego era eu
O doutor Aguiar apresentou-me aos colegas. Naquela época, eu apertava a mão de todo mundo. Antes de conseguir emprego como escriturário, eu já havia sido escravo numa fábrica de balanças. Uma firma antiga, dessas que ostentam logomarcas comemorativas por 50, 80, 300 anos sem falir, e nas quais se lê algo como: meio século de…
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Por sorte, tudo imperfeito
Vertigem da lua alta que não inspira, ar insuficiente. Respostas talvez encontradas, outra vez perdidas no sempre de minha breve viagem. Tudo era antes, enquanto. Eu é que cheguei. Você também, claro. Entende agora quando digo vertigem? O cemitério abandonado, degraus em ruínas por sobre os quais passeia um luar sem cânticos. Sonho com lugares…
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Pateta
Abracei-me ao Pateta. Chorei por ele pela primeira vez. Compreendi que não havia chances para uma criatura tão inofensiva e sem forças. Aconteceu-me encontrá-lo por acaso, junto ao rio. Três garotos carregavam um saco que se mexia. Perguntei, e um deles afrouxou a abertura para que eu visse parte do dorso de um animal imundo…