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Chora, menino (trecho)
… que acontecem
Texto apresentado no sarau da Casa do Poeta, novembro 2018.
Correu à avó, como pedindo socorro, a um passo de irromper em prantos e em pânico, a garganta afogada, porque vira na televisão alguma coisa sobre esqueletos, ossadas humanas, nem se lembrava ao certo. Era um menino pequeno.
Como ter certeza da imunidade, se era naquilo que se transformavam os outros? E o que acontecia a todos nós, depois de virarmos esqueletos? Da última vez que a irmã lhe pregara uma peça, trocando os pés dos sapatos sob a cama, para que ele os calçasse errado e, portanto, se transformasse num sapo, correra à avó como fazia agora. (A avó resolvia isso facilmente: “Não vai virar sapo nada não! Ora!”.) Sem dúvida, seria horrível tornar-se um sapo. Mas era muito pior ser esqueleto. Isso tinha o poder de preocupá-lo de verdade, perturbando-lhe o sono. Horrorizou-se muito mais quando a irmã, perseguindo-o pela casa até a cozinha, disse-lhe, rindo e animada pelo sarcasmo, como rogando uma praga: “Você também vai virar esqueleto! Ahahah!”, apontando-lhe o dedo, divertida, agora cantarolando: “Vai vi-rar es-que-le-to!”
“Vó, fala pra ela! Fala, fala! Fala pra ela!”
“Larga seu irmão, menina! Ora!”, colher de pau remexendo algo em uma panela escura. “Não vai virar esqueleto nada não! Ora! Vem cá, olha: acabei de fazer essas bolachinhas de chocolate.”
Marcas de gentis predadores – Guia de leitura
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