Office in a Small City por Edward Hopper

Roth – A marca humana

phillip roth

Um dos maiores autores de língua inglesa do século 20, esse escritor de Newark produziu romances de notável qualidade literária, com visão crítica de seu próprio país e da hipocrisia moralizante que controla os seres humanos. A fundação Library of America, que se dedica à publicação da obra dos expoentes da literatura norte-americana, anunciou, em 2013, a edição completa do trabalho de Philip Roth, com isso tornando-o o único autor vivo a receber essa honraria. A amostra escolhida integra o romance A marca humana, tratando do caso de um professor universitário que se envolve com uma mulher mais jovem e menos escolarizada, despertando reações de diversas pessoas, com seus preconceitos e ressentimentos, além de mostrar uma difícil realidade envolvendo um ex-combatente de guerra sob tratamento psiquiátrico, pretexto para desmascarar a hipocrisia na política e na sociedade em geral. Um romance com o tom do universo masculino, com a visão natural dos homens sobre a vida e sobre as mulheres, no qual se lê que “quando a gente não chega ao nível de franqueza sobre a sexualidade e em vez disso age como se nunca tivesse pensado no assunto, a amizade entre dois homens é incompleta.” Philip Roth e sua marca humana.

Quem são eles agora? São as versões mais simples de si próprios. A essência da singularidade. Tudo o que é doloroso imobilizado na paixão. Talvez já nem lamentem as coisas não serem diferentes do que são. A repulsa que acumularam é demais para permitir isso. Conseguiram sair debaixo de tudo aquilo que foi empilhado em cima deles. Nada na vida os tenta, nada na vida os excita, nada na vida atenua o ódio que sentem pela vida tanto quanto essa intimidade. […]

“Depois que você morre”, pergunta ela, “o que é que tem se você não se casou com a pessoa certa?”

“Não tem importância nenhuma nem mesmo quando você ainda está vivo. […]”

[…] nós deixamos uma marca, uma trilha, um vestígio. Impureza, crueldade, maus-tratos, erros, excrementos, esperma – não tem jeito de não deixar. Não é uma questão de desobediência. Não tem nada a ver com graça nem salvação nem redenção. Está em todo mundo. Por dentro. Inerente. Definidora. A marca que está lá antes do seu sinal. Mesmo sem nenhum sinal ela está lá. A marca é tão intrínseca que não precisa de sinal. A marca que precede a desobediência, que abrange a desobediência e confunde qualquer explicação e qualquer entendimento. Por isso toda essa purificação é uma piada. E uma piada grotesca ainda por cima. A fantasia da pureza é um horror. É uma loucura. Porque essa busca de purificação não passa de mais impureza. Tudo o que Faunia estava dizendo sobre a marca era que ela é inevitável. É claro que é assim que Faunia vê as coisas. Criaturas inevitavelmente marcadas pela impureza que somos. Resignadas com a imperfeição horrível e fundamental. Ela é como os gregos, os gregos de Coleman. Como os deuses deles. Eles são mesquinhos. Brigam. Lutam. Odeiam. Matam. Trepam. […] Para o rei dos deuses, carne nunca é demais, perversão nunca é demais. Toda essa loucura que o desejo traz. A dissipação. A depravação. Os prazeres mais grosseiros. E a fúria da esposa dele, que vê tudo. Não é o deus dos hebreus, infinitamente solitário, infinitamente obscuro, com sua monomania de ser o único deus que existe, que já existiu e que há de existir, e só se preocupa com os judeus e mais nada. E também não o homem-deus totalmente assexuado dos cristãos, com sua mãe imaculada e toda aquela culpa e vergonha que essa perfeição celestial inspira.

Philip Roth,  A marca humana.

Conheça aqui outro interessante escritor e sua visão crítica da hipocrisia humana.

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