Office in a Small City por Edward Hopper

Anjos – Eu e outras poesias

augusto dos anjos

Nenhuma escola literária o classificou – nem o Parnasianismo nem o Simbolismo. Seus primeiros poemas estavam próximos à obra de Cruz e Sousa, com aliterações e sonoridades, mas isso durou pouco. Um poeta único em nossa literatura, tendo como principal tema o enigma da existência e a morte, mas não só isso – seus versos revelam também uma intensa ansiedade ao tentar compreender a vida, como revelam trechos de seu “Poema negro”: “Para iludir minha desgraça, estudo. / Intimamente sei que não me iludo. […] A passagem dos séculos me assombra. / Para onde irá correndo minha sombra […]?” Como se não bastasse ser, por si só e pelo conteúdo de sua obra, um poeta absolutamente singular, ele ainda usava terminologia científica em seus versos, algo inédito e não imitado posteriormente. Publicou um único livro, apropriadamente chamado Eu, que resume o melhor do escreveu até os 28 anos. O Poeta da Morte, como é conhecido, faleceu aos 30 anos em razão de uma pneumonia, sem cura à época. (Talvez porque as mortes por tuberculose fossem muito associadas aos jovens poetas românticos, o que ele não era, muitos ainda pensam que ele teria sucumbido a essa doença.) Escolhi um de seus mais declamados poemas, um dos vários que mencionam o velho tamarindo que lhe serviu à infância e marcou fortemente sua memória. O tamarindo, ironicamente, ainda está lá, no Engenho do Pau d’Arco, na Paraíba, onde Augusto nasceu e compôs seus primeiros versos, aos sete anos de idade.

Debaixo do tamarindo

No tempo de meu Pai, sob estes galhos,
Como uma vela fúnebre de cera,
Chorei bilhões de vezes com a canseira
De inexorabilíssimos trabalhos!
 
Hoje, esta árvore, de amplos agasalhos,
Guarda, como uma caixa derradeira,
O passado da Flora Brasileira
E a paleontologia dos Carvalhos!
 
Quando pararem todos os relógios
De minha vida e a voz dos necrológios,
Gritar nos noticiários que eu morri,
 
Voltando à pátria da homogeneidade,
Abraçada com a própria Eternidade,
A minha sombra há de ficar aqui!  

Augusto dos AnjosEu e outras poesias.

Conheça este enigmático poeta romeno, sobrevivente do Holocausto.

Artistas da palavra

por

Publicado em

Leia também:

Comentários

2 respostas para “Anjos – Eu e outras poesias”

  1. Avatar de Matheus Ribeiro
    Matheus Ribeiro

    ” O poeta nada poético ” foi com essa definição que tomei conhecimento do Augusto, ainda no ensino médio. Realmente um cara incomparável, muito melhor que Bilac e sua rigidez parnasiana…

    1. Avatar de Perce Polegatto

      Uma definição interessante. Mas claro que ele era muito poético sim, chamando ao leão que urra nos bosques de irmão mais velho e à podridão de irmãs de caridade que vinham dar de comer às flores. Ele não era, para o padrão da época, aquele poeta previsível, tratando de temas menos sombrios e, de certa forma, mais inofensivos, como o faziam os parnasianos e os simbolistas.

Comentar