Office in a Small City por Edward Hopper

Arquimedes

A razão contra a guerra

Arquimedes

(Siracusa, Sicília, 287 a.C. – 212 a.C.)

Filho de um astrônomo sobre quem nada se sabe, é visto como o maior cientista e inventor da Antiguidade. Sua excepcional inteligência e sua capacidade inventiva somente foram comparadas às de Isaac Newton, que viveu dois milênios mais tarde. Em Alexandria, foi aluno e amigo de Cônon, que por sua vez fora discípulo do célebre matemático Euclides. De família aristocrática, Arquimedes não dependia da ajuda dos reis egípcios, por isso deixou o grande centro cultural que era Alexandria (o que não era comum na época, entre os jovens aprendizes e pensadores) e retornou a sua cidade natal. Certa vez, Hierão II, rei de Siracusa, pediu a ele que encontrasse uma maneira de determinar se uma coroa, que o tirano acabara de receber de seu ourives, era realmente de ouro puro ou se continha alguma mistura de prata. Em outro momento, ao entrar em sua banheira, o cientista observou que o volume de água que transbordava era igual ao volume de seu corpo, que tomava o lugar dela. Entendeu que poderia usar o mesmo raciocínio, com maior grau de precisão, para medir o volume da coroa sem danificá-la: se os volumes comparados, entre peças de ouro e de prata, fossem iguais, a coroa seria mesmo de ouro; se fosse uma falsificação, teria um volume maior, pois o volume da prata é maior que o do ouro. Entusiasmado com a descoberta, saiu correndo nu, pelas ruas da cidade, gritando Eureka! – que significa achei, encontrei. (Essas anedotas dificilmente podem ser confirmadas: não constam da obra do próprio cientista e, além disso, no caso específico da coroa, o método exigiria uma precisão que talvez não fosse possível com as técnicas disponíveis na época.) Arquimedes inventou o princípio da alavanca, no qual o peso e a distância são inversamente proporcionais, e criou o cilindro helicoidal oco, que servia como bomba d’água ao ser girado, e que ficou conhecido como Parafuso de Arquimedes, embora os egípcios já o usassem muito tempo antes. Com tais invenções, fundou a ciência da hidrostática, expondo pela primeira vez a lei do empuxo e a noção de centro de gravidade. Outra das ironias da história, ele não se orgulhava de seus inventos, que não considerava dignos de um filósofo, por isso só publicou seus trabalhos matemáticos. Chegou ao mais preciso valor de pi (π, razão entre o comprimento de uma circunferência e seu diâmetro) que se conhecia até então, superando os cálculos de seus predecessores. Arquimedes era também um guerreiro. Em 218 a.C., teve início a segunda Guerra Púnica, travada entre Roma e Cartago, a famosa cidade-estado fenícia, cujo líder, Aníbal, acabara de invadir a Itália. O sucessor de Hierão II posicionou-se ao lado de Cartago, o que motivou os romanos a atacarem Siracusa. Essa guerra, planejada para ser breve, esbarrou na engenhosidade de Arquimedes, que passou a criar uma série de armas e estratégias surpreendentes para resistir aos invasores. Entre elas, estreitas ameias de onde partiam setas, sem que os arqueiros pudessem ser contra-atacados, e guindastes mecânicos que podiam virar navios inimigos que se aproximassem da costa. Falava-se também de um sistema de lentes que concentravam a luz do Sol e podiam incendiar as embarcações romanas em pleno mar, relato que, como outros, não pôde ser confirmado. O cerco estendeu-se por três anos, até que, por fim, Siracusa caiu em mãos inimigas. O general Marcelo, comandante da missão, admitia que, de certa forma, aquela fora uma guerra de muitos contra um homem só: Arquimedes, o cérebro por trás da resistência. Durante a ocupação da cidade pelos romanos, o inventor mostrou-se indiferente e altivo, ignorando a rendição. Estava entretido com um problema teórico, desenhando figuras geométricas na areia, quando foi abordado por um soldado que anunciou sua prisão, ordenando-lhe que o acompanhasse, ao que teria respondido: “Não perturbe meus círculos.” O soldado, ao que tudo indica, um homem prático e sem tempo para antipatias, matou-o com sua espada. Marcelo, cujas ordens eram para que capturassem Arquimedes com vida e o tratassem com distinção (uma atitude incomum para um líder da época e, talvez, para qualquer época), lamentou sua morte e promoveu funerais dignos de um homem ilustre. O general levou, como única pilhagem pessoal de Siracusa, um artefato construído pelo genial inventor: um engenhoso planetário que foi admirado e estudado em Roma.

• Conta-se que a coroa avaliada por Arquimedes continha, de fato, porcentagens de uma liga de prata, o que levou à execução do ourives. Se for verdadeiro o relato de que o cientista correu nu pela cidade até o palácio do rei, é preciso lembrar que a nudez não incomodava os gregos, e isso pode ter sido visto apenas como uma divertida curiosidade.

• O princípio da alavanca explica por que um grande bloco de pedra pode ser erguido por um simples pé de cabra e ajuda a compreender melhor a construção de algumas das magníficas construções da Antiguidade. A tradução dos trabalhos de Arquimedes para o latim, que se deu somente em 1544, contribuiu para os estudos de cientistas como Stevinus, Huygens e Galileu.

• Os romanos não primavam pelas inovações. Usavam a ciência apenas com funções militar e política, enquanto outros povos, contemporâneos desse mesmo período, desenvolviam a matemática, a astronomia e outras ciências. Sobre Arquimedes, admitiam que não possuíam, de seu lado, ninguém como ele.

• A segunda Guerra Púnica ficou célebre por causa da travessia dos Pirineus e dos Alpes pelos exércitos de Aníbal, um dos mais brilhantes estrategistas da Antiguidade, o único que se atreveu a atacar Roma, tendo chegado muito perto de capturá-la, o que teria sido um feito notável. Foi bem sucedido em muitas batalhas, mas entre as baixas sofridas durante a travessia das cordilheiras, estavam muitos de seus elefantes de guerra, que sucumbiram por hipotermia.

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Imagem: Giulio Parigi. Arquimedes e o raio da morte. 1600.

(Afresco na Galeria Uffizi, Florença.)

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