Office in a Small City por Edward Hopper

Sonho 1128. A pedra de atrito

Então ele se deita no chão, com o rosto entre os braços, e irrompe a chorar convulsivamente, como uma criança.
Eu me aproximo, querendo saber o que aconteceu.

Meu amigo e eu caminhando por um bosque claro e tranquilo, árvores bem espaçadas, chão de folhas pardas, amarelas e cor de ferrugem, formando camadas de piso macio, como se, um dia antes, naquele mesmo lugar, muitos outonos houvessem acontecido ao mesmo tempo. Às vezes, o chão se faz duro de novo, inexplicavelmente, e caminhar torna-se mais difícil. Meu amigo me aponta pequenas porções de folhas verdes e também algumas pedras muito coloridas, umas azuis, outras vermelhas. Curiosamente, eu só as percebo quando ele as anuncia. Até então, eu poderia jurar que não havia nada colorido ali, ao nosso redor. Ele me conta, de alguma maneira, e não me lembra com que palavras, que as cores vão surgindo porque têm funções diferentes. Paramos diante de uma folha larga, caída no chão, uma folha que é de um vermelho muito vivo. Meu amigo apanha uma pedra e com ela tenta, sem sucesso, incendiar o que é agora um cacho de pequenas folhas vermelhas, configurando uma espécie de colônia vegetal. Então ele se deita no chão, com o rosto entre os braços, e irrompe a chorar convulsivamente, como uma criança. Eu me aproximo, querendo saber o que aconteceu. Ele me mostra, em prantos, a pedra cor de areia e diz: “A pedra de atrito… A pedra de atrito…”. Tomo nas mãos essa pequena pedra, e ela se fragmenta em três ou quatro partes entre meus dedos, desfazendo-se em grãos arenosos – tem a consistência de uma borracha em forma de pequeno tijolo, dessas que os estudantes usam como parte do material escolar. Tento consolá-lo, dizendo que isso não tem importância. Ele se levanta, suspirando ainda, fungando com tristeza, após a intensa crise de choro. Continuamos a andar lado a lado. Ele então me revela:

“Estão me propondo um ano e meio de curso, com apoio militar. Todos os treinamentos. Disseram que só cobrariam dez reais de cada um de nós.”

“Isso pode ser bom”, eu lhe digo.

Continuamos seguindo as trilhas e os espaços de folhas pardas, amarelas e cor de ferrugem, dos vastos outonos sobrepostos.

Inconsistência dos retratos – Guia de leitura

Sonho 1081. A carruagem veloz – anterior

Sonho 1204. A estação orbital – posterior

Imagem: Tom Thomson. Guirlanda de outono. 1916.

por

Publicado em

Categorias:

, ,

Leia também:

Comentários

Comentar