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O engenheiro e os fungos
A vida não tem cura. Viver é estar doente de tempo.
“Quero brocas de três metros para os baldrames. Fundação de primeira!”
Estou doente.
“A alvenaria de elevação saiu melhor que o previsto.”
Fungos que haverão de minar as paredes, carcomer os batentes. Meu corpo.
“Caixas de inspeção no corredor, inclusive no pátio interno. Não teremos problemas quanto a isso.”
Sua clareza de raciocínio me inspira pena. Tenho pena de todos nós. Estou doente.
“Já foi requisitada a extensão da rede elétrica.”
Tu, que habitas o futuro, sabes que tenho razão. Toda vez que plantam um poste e modificam a rua, alimentam os fungos, queimam estágios, aproximando o tempo a tempo nenhum. Os pedreiros, cobertos de suor e cal, metade vivos, metade fungos – estamos todos doentes. A vida não tem cura. Viver é estar doente de tempo.
“Cumeeiras de dez graus. Telhado, duas águas.”
A casa está pronta. Ele não sabe que estou doente. Aniquilado, disperso, perdido desde já entre milhões de anos que separam o passado do futuro, só me resta mudar. Alguns passos (vejo a casa de frente), a distância inconcebível.
“A casa está pronta!”
Mais esse fato demarca o tempo que não sei, nutre os fungos com o que somos e não sabemos.
Lisette Maris em seu endereço de inverno – Guia de leitura
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Leia mais textos sobre a ideia de tempo e sua fuga: Preço justo
Imagem: Ivan Serpa. Pintura No. 85. 1961.
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